"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

segunda-feira, 8 de maio de 2017

Do Império Celta ao Império Assírio I

Imagem: Guerreiro celta. Escultor desconhecido.

Um Império Celta dominava agora a Europa, dos Cárpatos ao Reno, do Danúbio ao Maciço Central.

A exploração do ferro de Halstat, na Áustria, depois a dos minérios da Lorena e de Borgonha forneceram aos celtas um aparelhamento e um armamento tais que, tão logo se estabelecem numa região, eles procedem a amplos roçados e cortam em todos os sentidos na floresta europeia.

Os celtas tomaram gosto pelos trabalhos agrícolas e a terra prospera nos vales onde um clima menos duro os reuniu. Removem o solo com uma charrua de duas rodas puxadas por bois, praticam a agrimensura, recobrem de argila as paredes de suas casas de madeira cobertas de palha, constroem torres de pedras, monumentos megalíticos e salas abobadadas.

A tribo celta possui ainda coletivamente a terra, mas a propriedade tende a se tornar individual e num solo há pouco desbastado não faltam as ocasiões de individualizar os bens: apanágios de chefes, dramas da vingança, fecundidade do rebanho - eis algumas circunstâncias que aumentam a fortuna de uns poucos em detrimento da propriedade coletiva. Os mais ricos guerreiros se juntam em assembleia em volta do chefe militar. Esse elo teria sido bem fraco numa sociedade dispersa por imensos espaços se não houvesse entre seus elementos mais disseminados uma unidade de pensamento muito forte, a do druidismo.

Os druidas formam uma confraria que se recruta por cooptação, resultante do totemismo primitivo que sobrevive na aliança pelo sangue. Sacerdotes, juízes e sábios a um tempo, eles estão isentos de impostos e de serviço militar. Presidem aos sacrifícios religiosos, emitem opinião em justiça, possuem todos os conhecimentos do mundo celta e educam a juventude dos ricos. Vem das regiões mais distantes para se reunirem em concílios junto aos dolmens ou menires, venerados antes deles pelos povos que os celtas submeteram. Conversam sem receio sobre a morte, pois crêem na imortalidade da alma [...] Respeitam a honra individual e seu respeito humano se estende à mulher. O celta é monógamo e admite o divórcio por consentimento mútuo.

As influências da terra penetraram tão bem a sociedade celta que seu culto é agrário. Os santuários são campos de feira. As festas terminam por corridas de cavalos: os celtas são apaixonados por elas. É o cavalo - a principal riqueza - que lhes conserva a mobilidade. Atrelam-nos a ligeiros cabriolés de duas rodas que descem as pitas e penetram por qualquer lugar em que o lenhador tenha aberto uma passagem.

Os roçados asseguram definitivamente ao Império celta seu progresso. Por se mostrarem tão bons pioneiros quanto intrépidos soldados, os celtas avançam de todos os pontos sobre esse continente desconhecido, essa Europa que quanto mais eles possuem, tanto mais os seduz.

RIBARD, André. A prodigiosa história da humanidade. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1964. V. 1. p. 71-2.

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