"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

quarta-feira, 1 de março de 2017

O fogo

Taos Pueblo - Luar, Eanger Irving Couse

As noites eram de gelo e os deuses tinham levado o fogo embora. O frio cortava a carne e as palavras dos homens. Eles suplicavam, tiritando, com a voz quebrada; e os deuses se faziam de surdos.

Uma vez lhes devolveram o fogo. Os homens dançaram de alegria e alçaram cânticos de gratidão. Mas de repente os deuses enviaram chuva e granizo e apagaram as fogueiras.

Os deuses falaram e exigiram: para merecer o fogo, os homens deveriam abrir peitos com um punhal de pedra e entregar corações.

Os índios quichés ofereceram o sangue de seus prisioneiros e se salvaram do frio.

Os cakchiqueles não aceitaram o preço. Os cakchiqueles, primos dos quichés e também dos maias, deslizaram com pés de pluma através da fumaça e roubaram o fogo e o esconderam nas covas de suas montanhas.

GALEANO, Eduardo. Memória do fogo: Os nascimentos. Porto Alegre: L&PM, 2013. p. 21-2.

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