"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

domingo, 5 de junho de 2016

Dos descobrimentos à colonização - Parte 5

[As sociedades coloniais americanas]


Escravos trabalhando numa plantação de tabaco na Virgínia, 
ca. 1670, Artista desconhecido



Em busca de novas terras e riquezas, homens brancos, armados de arcabuzes e mosquetes, lançaram-se ao mar em grandes embarcações de madeira, com velas feitas para navegar com qualquer vento e chegaram às costas da América, pouco tempo depois da histórica viagem de Cristóvão Colombo. Eram os espanhóis, que iniciavam, no final do século XV, a Conquista e a Colonização do Novo Mundo. Imagine-se um deles, fazendo parte da tripulação desses navios, vestido em reluzente armadura e montado a cavalo, desembarcando nas ilhas antilhanas, no México ou no Panamá. Sendo um desses aventureiros, sua sede de conquista não teria limites, e então você avançaria até os altiplanos do Peru e da Bolívia, ou penetraria a foz do Nhamundá, em plena Floresta Amazônica, lutando contra lendárias mulheres guerreiras! Em busca do fabuloso Eldorado, atingiria a encantada lagoa de Guatavitá, na Colômbia, ou procuraria em vão a Fonte da Juventude, na Flórida. Talvez descesse ao extremo meridional do continente, atraído pelas riquezas que diziam existir no Rio da Prata.

Poucos povos têm uma história tão fantástica quando a do Novo Mundo. Aqui desenvolveram-se sociedades indígenas que rivalizavam com as antigas civilizações do Egito, da Índia e da China: os astecas, os incas e os maias. Como aconteceu com os conquistadores espanhóis, você certamente se surpreenderia com o elevado grau de cultura desses povos, e provavelmente também se horrorizaria com os seus costumes e sacrifícios religiosos, considerados bárbaros pelos europeus, que, no entanto, não hesitavam em cometer as maiores atrocidades.

Os conquistadores estavam sequiosos de puro e de outras riquezas metálicas, atendendo às suas ambições pessoais e aos interesses da política mercantilista da Coroa espanhola. Revolveram as montanhas do México, do Peru e da Bolívia em busca dos metais preciosos, e encontraram muito ouro e prata. Arrasaram as antigas cidades, templos e monumentos e, em seu lugar, ergueram novas cidades, nos moldes europeus.

Cumpria-se a antiga profecia indígena:

"Um dia virão homens brancos do Leste, com barbas compridas e trarão desgraça."

Com a destruição física e cultural das sociedades indígenas, teve início a Colonização espanhola, que se estenderia por mais de três séculos. A América Espanhola atraía cada vez mais aventureiros, sobretudo por causa das minas de ouro e prata. Não tardou que a mão-de-obra indígena empregada no trabalho minerador e na agricultura fosse reduzida a um regime de servidão coletiva.

O controle da metrópole espanhola era rígido, utilizando o sistema das frotas anuais e dos portos exclusivos. Apesar disso, o contrabando era prática regular, assim como eram frequentes os ataques de piratas e corsários, entre eles o famoso Francis Drake, aos galeões espanhóis carregados de metais preciosos.

Um século depois de descobertas, as minas já apresentavam sinais de esgotamento. Nas áreas onde não havia metais preciosos, organizaram-se grandes plantações de produtos tropicais - cana-de-açúcar, tabaco - com mão-de-obra escrava constituída por negros africanos. O tráfico negreiro foi uma atividade muito lucrativa para os comerciantes europeus, apesar de quase metade dos negros embarcados morrer durante a viagem, devido às péssimas condições de travessia oceânica. Mesmo assim, os que aqui chegavam eram vendidos por preços tão altos que compensavam as perdas sofridas.

Vamos usar novamente a imaginação? Tente agora ver-se como um austero puritano (adepto do Calvinismo), nascido na Inglaterra do século XVII e perseguido pela intolerância religiosa dos Reis da dinastia Stuart. Você, provavelmente, seria um dos Pilgrim Fathers (Pais Peregrinos), fundadores de Plymouth, uma das primeiras colônias inglesas da América do Norte.

Já pensou como teria sido a acidentada viagem ao Novo Mundo? Você cruzaria o Atlântico a bordo do Mayflower, durante quatro a seis semanas, enfrentando tempestades e toda sorte de desconfortos, até alcançar o litoral americano e poder dizer, como um cronista da época:

"O ar a 12 léguas de distância tinha a fragrância de um jardim florido."

Além dos puritanos, membros de outros credos religiosos, como os quakers, presbiterianos e católicos, também se dirigiram à América. A Inglaterra vivia então um período de grande instabilidade social. Artesãos que não encontravam condições de sobrevivência, pessoas desempregadas e camponeses expulsos de suas terras pelos criadores de carneiros esperavam encontrar no novo continente melhores oportunidades.

Como o governo inglês não patrocinou a emigração para a América, essa iniciativa coube a particulares - Proprietários e Companhias de Comércio. Porém, a maior parte dos que cruzaram o oceano não dispunha de recursos para o custeio da viagem. Se você fosse um deles, para viajar com a sua família teria de assinar um contrato de trabalho por um prazo determinado, sem receber qualquer salário, findo o qual a dívida da passagem e da manutenção estaria paga. Era a chamada servidão por dívidas.

Embora os ingleses constituíssem a maioria, também irlandeses, escoceses, suecos, holandeses, franceses vieram para a América do Norte.

"Afinal de contas as terras eram dos indígenas que, não sendo cristãos, podiam ser expropriados, sem que isso fosse considerado pecado..."

A característica dominante do desenvolvimento das colônias inglesas foi a falta de controle efetivo por parte do governo inglês - a chamada Negligência Salutar -, contrariamente ao que ocorreu na América Espanhola. Com exceção das colônias inglesas do Sul, as demais seguiram sua evolução econômica e desfrutaram de consideráveis liberdades políticas. Quando, no século XVIII, essa situação se modificou, devido à intensificação do Pacto Colonial, os colonos se revoltaram e pegaram em armas contra a metrópole.

AQUINO, Rubim Santos Leão de [et alli]. Fazendo a História: As sociedades Americanas e a Europa na Época Moderna. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1990. p. 70-2.

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