"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

O Império Bizantino e sua cultura (Parte 2): Arte e Legado

Retrato do Imperador bizantino Alexio I Comneno. Artista desconhecido.

- A arte bizantina. Os gostos do povo bizantino, inclinado ao luxo e ao esplendor, expressavam-se abundantemente na sua arte. Esta não era, contudo, um mero emblema de deleite sensorial, mas mostrava-se profundamente condicionada pelos ideias peculiares à própria civilização. Por exemplo, a forte corrente de ascetismo proibia a glorificação do homem; em consequência disso, a escultura não teve grandes possibilidades de desenvolvimento. A arte que mais se destacou foi a arquitetura, que tinha de ser mística e extraterrena. Além disso, sendo a civilização bizantina um composto de elementos romanos e orientais, era inevitável que a sua arte continuasse o amor à grandiosidade e o talento da engenharia romana com a variedade de colorido e a riqueza de detalhes característicos do Oriente.

- A Igreja de Santa Sofia. A suprema obra artística da civilização bizantina foi a igreja de Santa Sofia (Santa Sabedoria), construída com enorme dispêndio de dinheiro pelo imperador Justiniano. Embora projetada por arquitetos de sangue helênico, muito diferia de qualquer templo grego. Seu fim não era exprimir o orgulho do homem em si mesmo ou a satisfação com esta vida, mas simbolizar o caráter introspectivo e espiritual da religião cristã. Eis por que os arquitetos deram pouca atenção à aparência externa do edifício. Nas paredes exteriores não usaram senão tijolos recobertos com argamassa; não empregaram revestimentos de mármore, colunas graciosas nem cornijas esculpidas. O interior, no entanto, era decorado com mosaicos ricamente coloridos, com folhas de ouro, colunas de mármore de várias cores e pedaços de vidro colorido, colocados de quina para refletir os raios solares de modo que cintilassem como pedras preciosas. Por essa razão, também, o edifício foi construído de tal modo que parecia não vir nenhuma luz de fora, mas nascer toda ela no interior.

[...]

- Outras artes bizantinas. As outras artes bizantinas incluíam a escultura, em marfim, os objetos de vidro com relevos, os brocados, as iluminuras em manuscritos, a ourivesaria e a joalheria, e muita pintura. Esta, porém, não se desenvolveu tanto como as outras artes. Os artistas bizantinos em geral preferiam os mosaicos. Eram desenhos conseguidos pela combinação de pequenos pedaços de vidro ou de pedra coloridos, formando padrões geométricos, figuras simbólicas de plantas e animais, ou mesmo uma cena rebuscada de significado teológico. As representações dos santos e de Cristo eram comumente deformadas para criar a impressão de intensa piedade.

- A influência de Bizâncio na Europa Oriental. [...] Foi ela, sem dúvida, o fator mais poderoso na determinação do rumo da evolução da Europa Oriental. A civilização imperial da Rússia baseou-se em grande parte nas instituições e nas realizações de Bizâncio. A igreja russa foi um reflexo da chamada igreja ortodoxa grega ou igreja oriental, que se desligou de Roma em 1054. O czar, como chefe da igreja e do estado, ocupava uma posição análoga à do imperador em Constantinopla. Também eram de origem bizantina a arquitetura, o calendário e grande parte do alfabeto russo. [...]

- A influência bizantina no Ocidente. Mas a influência bizantina não se limitou à Europa Oriental. Seria difícil superestimar a dívida do Ocidente para com os eruditos de Constantinopla e dos territórios vizinhos, que copiaram e conservaram manuscritos, prepararam antologias de literatura grega e escreveram enciclopédias que enfeixavam os conhecimentos do mundo antigo. Além disso, os eruditos bizantinos exerceram influência notável na Renascença Italiana. A despeito de terem os imperadores orientais perdido finalmente o controle da Itália, muitos de seus antigos súditos continuaram a viver lá e alguns outros fugiram para as cidades italianas depois da repressão do movimento iconoclasta. As relações culturais entre o Oriente e o Ocidente foram também favorecidas pelo largo comércio entre Veneza e Constantinopla, na Idade Média. Consequentemente, as bases para um reflorescimento do interesse pelos clássicos gregos já tinham sido lançadas muito antes de Manuel Chrysoloras e outros eminentes eruditos gregos chegarem à Itália, no século XV. Do mesmo modo, a arte bizantina influiu na arte da Europa Ocidental. Alguns especialistas consideram os vitrais das catedrais góticas como uma adaptação dos mosaicos das igrejas orientais. Muitas das mais famosas igrejas italianas, como por exemplo a de S. Marcos, em Veneza, foram construídas partindo de uma fiel imitação do estilo bizantino. A pintura bizantina também influenciou a da Renascença, especialmente a da escola veneziana e a de El Greco. Finalmente, foi o Corpus Juris de Justiniano que possibilitou realmente a transmissão do direito romano à segunda fase da Idade Média e ao mundo moderno.

BURNS, Edward McNall. História da Civilização Ocidental. Porto Alegre: Globo, 1964. p. 295-297. [Volume 1]

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