"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Interação e intercâmbio no Mundo Antigo

Carro de guerra hitita

Por volta do ano 1000 a.C. haviam surgido vários padrões de civilização no Oriente Próximo e a leste do Mediterrâneo. [...] Nesta região, as grandes potências já estavam acostumadas a lidar umas com as outras através da diplomacia formal. Artesãos, mercadores e mercenários se deslocavam em busca da sobrevivência. Ideias, estilos artísticos e habilidades técnicas já eram conscientemente trocadas e absorvidas por toda parte. [...] A melhor maneira de se começar a entender isso é [...] através das idas e vindas dos povos, das migrações e dos movimentos populares [...]. Por todo o segundo milênio antes de Cristo, a Índia, o Irã, a Mesopotâmia, o Levante, o Egito e o Mar Egeu mostram o impacto dos povos cujas línguas chamamos de indo-europeias. [...]

No Crescente Fértil esses povos entraram em conflito com os velhos impérios que dominavam a região desde a vitória da Suméria. Os povos semitas também estavam se deslocando. [...]

As migrações devem ter acelerado enormemente a expansão das práticas civilizadas. A instrução é um indicador. Em 2000 a.C. ela ainda era muito confinada às civilizações dos vales dos rios, embora a escrita cuneiforme se espalhasse pela Mesopotâmia e servisse para registrar duas ou três línguas. No Egito, enquanto as inscrições dos monumentos eram feitas em hieróglifos, a escrita cotidiana era realizada numa forma simplificada, chamada hierática, e usava-se o cuneiforme para a diplomacia. Cerca de mil anos depois, as línguas identificam povos instruídos em todo o Oriente Próximo e ainda em Creta e na Grécia. Novas escritas estavam sendo inventadas. Uma delas, em Creta, por volta de 1500 a.C., nos conduz ao limiar de um novo mundo, ao revelar um povo usando uma forma de grego. A escrita da primeira literatura ocidental estava em uso por volta de 800 a.C. e se baseava no alfabeto desenvolvido por uma línga semita, tomada emprestada dos fenícios.

Como a linguagem, o comércio de longa distância é ao mesmo tempo sintoma e motor de mudança. Por muito tempo ele somente aparece através da arqueologia, que mostra evidências como a do porto de Harappa e a descoberta de sinetes estrangeiros. A partir dessas provas sabe-se que o estanho foi trazido da Mesopotâmia e do Afeganistão, bem como da Anatólia, para o que hoje chamaríamos de centros de "manufatura". O cobre de Chipre surge em tantos lugares que deve ter sido amplamente comercializado [...]. Quanto aos produtos não metalúrgicos, o cedro do Líbano [...] estava sendo fornecido ao Egito; o âmbar era trazido do Mar Báltico para o Mar Egeu, e as especiarias do Extremo Oriente vinham pelo Mar Vermelho para o Egito, tudo isto antes de 1000 a.C. [...] O transporte das mercadorias era difícil [...] e era feito por asnos e burros até que os camelos fossem domesticados, em meados do segundo milênio antes de Cristo. Isto desbravou um meio ambiente até então quase impenetrável - o deserto árido - e criou o comércio de caravanas da Ásia e da Arábia. Por muito tempo o transporte sobre rodas teve importância quase local, devido à má qualidade das primeiras estradas [...], embora já se usassem carroças na Mesopotâmia por volta de 3000 a.C. [...]. Mas para mercadorias em quantidade o transporte pelo mar já era mais simples e mais barato do que por terra [...]. Muito antes das caravanas de camelos, os navios levavam as gomas e as resinas do sul da Arábia até o Mar Vermelho. Outros se deslocavam de um lado para outro pelo Mar Egeu. [...]


[...]

Faz parte da história do desenvolvimento da civilização a transferência de tecnologia, outra força libertadora e estimulante. [...] Os carros de guerra e a cavalaria dos indo-europeus alteraram as operações em campo aberto em todo o Oriente Próximo. Embora os soldados da Suméria sejam retratados guiando toscas carroças de quatro rodas puxadas por burros, este era provavelmente o único meio de locomoção dos generais ou de se levar um líder à confusão da batalha para que ele pudesse pôr em ação sua lança e seu machado. O verdadeiro carro de guerra é um veículo de luta de duas rodas, puxado a cavalo, em geral com dois tripulantes, um deles conduzindo o carro e o outro o usando como plataforma para arremessar armas, especialmente flechas lançadas dos arcos. Sabe-se que os cassitas [...] foram os primeiros a usar esta forma de luta.

[...] No segundo milênio antes de Cristo, partes dos carros de guerra começaram a ser feitas de ferro, especialmente as rodas, presas com este metal. As outras vantagens militares do ferro como material bélico são óbvias, e o seu uso se espalhou rapidamente pelo Oriente Próximo [...]. 

[...]


Há um novo âmbito para a diferenciação. A alfabetização ajudou a distinguir a tradição e um senso de pertencer a um grupo específico. Antes do início da civilização, a arte já se estabelecera [...]. Jogos de tabuleiro surgem na Mesopotâmia, no Egito e em Creta, e por toda parte reis e nobres caçavam com paixão e eram entretidos, nos palácios, por músicos e dançarinos. O boxe parece ter sido popular primeiro na Idade do Bronze, em Creta, ilha onde também era praticado um esporte único e provavelmente ritualístico: o salto sobre o touro.

ROBERTS, J. M. O livro de ouro da História do mundo. Rio de Janeiro: Ediouro, 2001. p. 136, 138-143.

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